Na Tunísia e no Egito, o movimento popular iniciado em janeiro e que
culminou na queda dos longevos ditadores Ben Ali e Hosni Mubarak foi
rápido e ganhou o nome de Primavera Árabe. Já na Líbia de Muamar Kadafi,
só agora está chegando ao fim uma guerra civil que já dura seis meses.
Toda a região foi sacudida pela Primavera Árabe. No Marrocos, o rei
Mohammed VI foi pressionado pelo povo a convocar um referendo, em julho,
que restringiu os poderes do monarca e fortaleceu o governo. É uma
tentativa de acalmar os súditos, mas ainda há protestos por empregos e
combate à corrupção. Na Argélia, o presidente Bouteflika suspendeu as
restrições à liberdade de expressão e pôs fim a 19 anos de estado de
emergência. A situação ainda está indefinida no Iêmen, onde desde
janeiro há manifestações pelo fim da ditadura de Ali Abullah Saleh,
seriamente ferido num ataque ao palácio presidencial em junho e em
tratamento na Arábia Saudita. Nem este país escapou dos protestos: o rei
Abdullah anunciou medidas para elevar ainda mais o nível de vida da
população e, como as manifestações não cessassem, decretou-as
anti-islâmicas. Na Síria, a pressão sobre o regime de Bashar Assad é
cada vez maior, assim como o número de mortos pela repressão do ditador.
O foco está na Líbia pós-Kadafi, cujo regime entra nos estertores.
Décadas de mão de ferro deixaram o país sem instituições dignas de
crédito e sem uma sociedade civil organizada – ela ainda se baseia em
relações tribais. São muitos os perigos para o povo líbio: o regime de
Kadafi desmorona e não se sabe como se comportarão agora os rebeldes,
que se uniram no Conselho Nacional de Transição (CNT) pela derrubada do
tirano. O maior risco é o vácuo de poder, que pode dar lugar a lutas
entre as várias tribos do país e até entre lideranças dos rebeldes
vitoriosos. É preciso que a comunidade internacional esteja atenta.
Líderes mundiais deram declarações neste sentido. O presidente Obama
afirmou que os EUA serão um “amigo e parceiro para ajudar uma Líbia
democrática a emergir na era pós-Kadafi”, mas alertou o CNT a evitar
atos de vingança. O premier britânico, David Cameron, declarou que o
processo de transição para a democracia “deve ser dirigido pelos líbios,
com amplo apoio internacional coordenado pela ONU”. A França anunciou
planos para uma reunião internacional na próxima semana a fim de
coordenar os esforços de ajuda à transição, enquanto a Itália mandou
especialistas a Benghazi, base dos rebeldes, para auxiliar no
planejamento da reconstrução e na restauração da produção de óleo e gás,
principais riquezas líbias.
A Primavera Árabe é um processo de longo prazo, sujeito a avanços e
recuos tantos são as forças e os interesses envolvidos. Para o Brasil,
infelizmente, a crise líbia marcou o recuo da diplomacia da presidente
Dilma Rousseff, anunciadamente comprometida com os direitos humanos,
para a posição de “diplomacia companheira” da era Lula, que chamava
Kadafi de “amigo e irmão”. Em março, o Brasil se absteve na ONU ao votar
a resolução que criou uma zona de exclusão aérea na Líbia para que
aviões da Otan atuassem em apoio aos rebeldes. E só agora, com a
situação praticamente resolvida, Brasília deverá reconhecer o CNT como
governo legítimo, em flagrante atraso diante da maioria absoluta de
atores com importância na cena internacional. É o velho cacoete do
antiamericanismo.
Nídia Freire
Nenhum comentário:
Postar um comentário