segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Roteiro para a Era pós-Kadafi

             Na Tunísia e no Egito, o movimento popular iniciado em janeiro e que culminou na queda dos longevos ditadores Ben Ali e Hosni Mubarak foi rápido e ganhou o nome de Primavera Árabe. Já na Líbia de Muamar Kadafi, só agora está chegando ao fim uma guerra civil que já dura seis meses.
Toda a região foi sacudida pela Primavera Árabe. No Marrocos, o rei Mohammed VI foi pressionado pelo povo a convocar um referendo, em julho, que restringiu os poderes do monarca e fortaleceu o governo. É uma tentativa de acalmar os súditos, mas ainda há protestos por empregos e combate à corrupção. Na Argélia, o presidente Bouteflika suspendeu as restrições à liberdade de expressão e pôs fim a 19 anos de estado de emergência. A situação ainda está indefinida no Iêmen, onde desde janeiro há manifestações pelo fim da ditadura de Ali Abullah Saleh, seriamente ferido num ataque ao palácio presidencial em junho e em tratamento na Arábia Saudita. Nem este país escapou dos protestos: o rei Abdullah anunciou medidas para elevar ainda mais o nível de vida da população e, como as manifestações não cessassem, decretou-as anti-islâmicas. Na Síria, a pressão sobre o regime de Bashar Assad é cada vez maior, assim como o número de mortos pela repressão do ditador.
               O foco está na Líbia pós-Kadafi, cujo regime entra nos estertores. Décadas de mão de ferro deixaram o país sem instituições dignas de crédito e sem uma sociedade civil organizada – ela ainda se baseia em relações tribais. São muitos os perigos para o povo líbio: o regime de Kadafi desmorona e não se sabe como se comportarão agora os rebeldes, que se uniram no Conselho Nacional de Transição (CNT) pela derrubada do tirano. O maior risco é o vácuo de poder, que pode dar lugar a lutas entre as várias tribos do país e até entre lideranças dos rebeldes vitoriosos. É preciso que a comunidade internacional esteja atenta.
               Líderes mundiais deram declarações neste sentido. O presidente Obama afirmou que os EUA serão um “amigo e parceiro para ajudar uma Líbia democrática a emergir na era pós-Kadafi”, mas alertou o CNT a evitar atos de vingança. O premier britânico, David Cameron, declarou que o processo de transição para a democracia “deve ser dirigido pelos líbios, com amplo apoio internacional coordenado pela ONU”. A França anunciou planos para uma reunião internacional na próxima semana a fim de coordenar os esforços de ajuda à transição, enquanto a Itália mandou especialistas a Benghazi, base dos rebeldes, para auxiliar no planejamento da reconstrução e na restauração da produção de óleo e gás, principais riquezas líbias.
               A Primavera Árabe é um processo de longo prazo, sujeito a avanços e recuos tantos são as forças e os interesses envolvidos. Para o Brasil, infelizmente, a crise líbia marcou o recuo da diplomacia da presidente Dilma Rousseff, anunciadamente comprometida com os direitos humanos, para a posição de “diplomacia companheira” da era Lula, que chamava Kadafi de “amigo e irmão”. Em março, o Brasil se absteve na ONU ao votar a resolução que criou uma zona de exclusão aérea na Líbia para que aviões da Otan atuassem em apoio aos rebeldes. E só agora, com a situação praticamente resolvida, Brasília deverá reconhecer o CNT como governo legítimo, em flagrante atraso diante da maioria absoluta de atores com importância na cena internacional. É o velho cacoete do antiamericanismo.
Nídia Freire

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